A responsabilidade de intermediários na internet é uma questão bastante polêmica.
Afinal, se os provedores não são os autores do conteúdo danoso, até que ponto eles deveriam agir para impedir que essa informação seja disseminada?
À luz de preceitos como a liberdade de expressão, que deve estar presente na rede, fica complicado aplicar restrições ao que é publicado.
Por outro lado, dependendo do serviço que prestam, os intermediários têm condições e são requisitados para impedir crimes como golpes online, fraudes e ofensas à honra de uma pessoa ou grupo.
Neste artigo, vamos falar sobre o significado, tipos e limites para a responsabilidade de intermediários na web, incluindo orientações definidas em uma das principais leis desse segmento – o Marco Civil da Internet.
Se o tema interessa, siga com a leitura.
Preparamos os seguintes tópicos para este conteúdo:
Acompanhe até o final!
Intermediários na internet são, em geral, empresas que atuam como provedoras de serviços que colaboram para o uso da rede, de forma ampla.
Ou seja, elas conectam outras empresas e/ou o usuário final à rede mundial de computadores, permitindo desde o acesso à web até a contratação de determinada velocidade para navegação, hospedagem de sites, compartilhamento de informações, etc.
A fim de facilitar a compreensão de suas atividades e responsabilidades, os intermediários podem ser divididos, conforme explica o texto “Responsabilidade civil dos provedores de Internet: diálogo entre a jurisprudência e o marco civil da Internet“.
Escrito pelo advogado Hian Silva Colaço, o documento adota uma classificação popular para os intermediários na internet, conforme explicamos a seguir.
Backbone é um termo emprestado do inglês, que pode ser traduzido como espinha dorsal.
Empregar essa palavra ao contexto da rede mundial de computadores é apropriado, pois as companhias que oferecem serviços de backbone atuam nos bastidores, fornecendo a estrutura necessária para a entrada e saída de dados entre servidores.
Lembrando que os servidores são os programas ou computadores que centralizam informações e as distribuem para uma determinada rede, ofertando, por exemplo, serviços de e-mail.
Se valem da estrutura mantida pelos provedores de backbone para vender serviços de conexão à internet, atuando como um tipo de ponte para o usuário final.
Para tanto, disponibilizam um modem a cada cliente, que faz a conexão entre o servidor da empresa e os dispositivos do cliente.
É assim que computadores, notebooks, smartphones, tablets e outros devices são transformados em nós da rede, obtendo acesso à internet.
São as companhias que trabalham fornecendo serviços de e-mail – transmissão, armazenamento e recebimento de mensagens através da web.
Cada interface é personalizada segundo as preferências, mensagens, contatos, pastas e movimentações realizadas pelo usuário titular do correio eletrônico, que cria login e senha para proteger suas informações.
Na prática, ao inserir seu login e senha, o titular estará acessando o servidor que viabiliza o serviço de e-mail.
Também chamado de hosting provider, é contratado por pessoas físicas ou jurídicas para arquivar, proteger e viabilizar acesso remoto a diferentes informações.
Assim, o provedor de hospedagem cede um espaço em seu disco rígido para que os usuários visualizem, editem e/ou compartilhem, de acordo com limites definidos em contrato e na criação de diferentes permissões de acesso.
Segundo define o advogado Hian Silva Colaço:
“Os provedores de hospedagem são responsáveis por garantir o armazenamento de arquivos em servidores remotos, possibilitando acesso de usuário contratante, nos termos pactuados. Assim, a função principal dessa espécie de provedores é hospedar páginas ou arquivos de terceiros e disponibilizá-los aos outros internautas, conforme regras de privacidade escolhidas pelo titular dos arquivos.”
São empresas que oferecem canais para o compartilhamento de informações, sejam elas próprias ou de terceiros.
Há estudiosos que inserem subclassificações dentro dos provedores de conteúdo, especificando, por exemplo, os provedores de busca ou pesquisa – Google, Bing, Yahoo.
Eles empregam um algoritmo para mostrar aos internautas páginas que contêm a palavra-chave pesquisada, ou seja, para evidenciar informações de terceiros.
Já os portais de notícias e os blogs divulgam informações previamente selecionadas e editadas por uma equipe responsável, publicando conteúdos próprios.
Eles também podem divulgar ideias de terceiros em espaços determinados, como em colunas assinadas por especialistas ou seções de comentários dos leitores.
Dependendo do país ou território, os intermediários têm uma responsabilidade maior ou menor a respeito das informações publicadas por terceiros através de seus serviços.
Essa responsabilidade costuma ser definida na esfera legislativa, a fim de que casos de abuso, conteúdo impróprio e crimes sejam identificados, julgados e punidos segundo a lei.
De qualquer forma, a questão é complexa, uma vez que os provedores de serviços relativos à internet não são os autores das informações, embora tenham seu papel na disseminação ao disponibilizar meios para usuários mal intencionados.
Daí a judicialização de uma série de denúncias a respeito de informações divulgadas na web, seja em sites, redes sociais, blogs ou outras plataformas.
O fato de os provedores de conteúdo não exercerem um controle rígido sobre os dados de clientes no Brasil favorece a preservação da intimidade, contudo, facilita a criação de perfis falsos que ajudam a acobertar condutas agressivas e até criminosas.
Por isso, o país optou por um modelo misto de responsabilização, que leva em conta o tipo de contrato e serviço fornecidos pelo intermediário para atribuir suas obrigações nesses casos.
Veja, abaixo, algumas modalidades para tratar do tema.
Nessa situação, o intermediário assume a posição de autor das informações veiculadas em sua plataforma, tendo como função filtrar, editar e remover o que considerar ofensivo.
Esse tipo de responsabilização aos provedores de serviços de internet costuma ser adotado apenas em nações com regimes restritivos, nas quais o Estado exerce grande influência, mesmo na esfera privada.
No Brasil, a responsabilidade direta cabe ao agente que, de fato, gerou o dano. Ele deve reparar esse dano.
Existe, ainda, a responsabilidade indireta, que decorre do ato de terceiros, nos termos dos Arts. 932, 936, 937 e 938 do Código Civil (CC).
A questão se complica porque o CC disciplina somente as relações de consumo, que nem sempre estão presentes nos contratos de intermediários na internet.
Os provedores de backbone, por exemplo, raramente estabelecem esse tipo de relacionamento, pois é difícil ofertarem serviços diretamente ao consumidor final.
É o oposto da responsabilidade direta, porque confere isenção aos intermediários na internet caso eles sigam algumas regras expressas em lei.
Normalmente, as exigências liberam os provedores de serviços de internet de qualquer reparação, desde que, ao serem notificados por usuários ou entidades, removam as supostas informações prejudiciais.
Ou seja, no regime de porto seguro os intermediários podem retirar qualquer conteúdo de sua plataforma, mesmo antes de uma análise que comprove os danos em potencial.
Conhecido como modelo de base judicial, esse tipo de responsabilização afirma, num primeiro momento, que o intermediário não é responsável por conteúdos que não tenha editado ou modificado.
No entanto, o cenário muda se ele receber notificação judicial para retirar uma informação de sua plataforma e não cumprir essa ordem.
Caso seja exigido pela Justiça, o provedor de serviços de internet tem a obrigação de remover o conteúdo, sob a pena de ser considerado responsável por ele.
Antes de entrar no assunto sobre as responsabilidades de intermediários, vamos voltar um passo e falar sobre o Marco Civil da Internet.
Consolidado pela Lei 12.965/14, esse instrumento estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil.
Junto a outras normas do direito digital, a legislação fornece os parâmetros para a oferta de serviços online, coleta, proteção e armazenamento de dados, bem como os direitos e deveres dos usuários.
Segundo o documento, 8 princípios regem essas relações no Brasil:
Seguindo essas premissas, o Marco Civil da Internet (MCI) aborda a responsabilização de provedores em diferentes situações, conforme detalhamos abaixo.
Conforme menciona a Seção I, os provedores de internet devem prezar pela neutralidade de rede, tratando todos os pacotes de dados de forma isonômica.
Em outras palavras, o intermediário que atue como provedor de acesso não pode, por exemplo, diminuir a velocidade durante a visita a um site concorrente.
Segundo a própria legislação:
“Na provisão de conexão à internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados, respeitado o disposto neste artigo.”
Então, os provedores de acesso são proibidos de editar ou retirar informações publicadas pelos usuários.
Caso desobedeçam a essas determinações, poderão responder perante a Justiça.
Na Seção II, o Marco Civil da Internet reforça a necessidade de proteção aos registros, dados pessoais e comunicações privadas.
Com exceção de dados cadastrais (qualificação pessoal, filiação e endereço), que podem ser requisitados por algumas autoridades administrativas, o restante das informações deve ser preservada do acesso por terceiros.
Elas só serão liberadas pelos intermediários mediante ordem judicial.
Qualquer serviço que não seguir essas exigências estará violando a privacidade do usuário e ficará sujeito a sanções cíveis, criminais ou administrativas decorrentes da infração.
Também poderá ser penalizado por meio de:
Outro trecho de destaque na Lei 12.965/14 é a Seção III, que fala diretamente sobre a responsabilidade dos intermediários diante de informações danosas publicadas por usuários.
Nesse cenário, os Arts. 18 e 19 resumem a recomendação para a maior parte dos casos:
“Art. 18. O provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros.
“Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.”
No Art. 21, a legislação traz mais uma situação sensível que pode gerar penalidades para empresas ou pessoas que atuem como intermediários na internet – em especial, provedores de hospedagem e conteúdo, deixando claro que:
“O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente da divulgação, sem autorização de seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo participante ou seu representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo.”
Em resumo, os provedores de backbone e de acesso, que não lidam diretamente com as informações divulgadas na rede mundial de computadores, não podem ser responsabilizados civilmente pelo conteúdo produzido por terceiros.
Já os demais intermediários precisam ficar atentos a notificações de usuários para bloquear conteúdos que violem a intimidade.
Também devem obedecer às notificações judiciais requerendo dados de internautas envolvidos em denúncias e investigações.
A liberdade de expressão é uma garantia fundamental que consta na Declaração Universal dos Direitos Humanos, publicada pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Marca presença, ainda, entre as garantias fundamentais expressas na Constituição Federal, em trechos do Art. 5º e Art. 200. Este último diz:
“A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
“É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”
Observamos, então, que vem da carta magna a inspiração para que o Marco Civil vede a edição ou controle do que é publicado na internet.
Afinal, a liberdade de expressão também deve ser respeitada no ambiente online.
No entanto, como mostramos no tópico acima, esse princípio não pode ser utilizado para acobertar esquemas, fraudes ou condutas criminosas.
Também não deve apoiar a distribuição de declarações ou notícias falsas (fake news), discursos de ódio, cyberbullying e ofensas a pessoas ou grupos.
Vemos, aqui, evidenciado o dilema entre liberdade e segurança; quanto maior é uma delas, menor a outra se torna.
É por isso que diversos conflitos originados na web acabam nas mãos de advogados, promotores e juízes, a fim de que esses profissionais possam avaliar suas particularidades e decidir o que vai prevalecer em cada caso.
De qualquer forma, é indispensável o bom senso na hora de publicar, compartilhar ou encaminhar mensagens através de aplicativos, redes sociais, sites e outros locais online.
Uma boa pedida é adotar o mundo offline como regra, transportando o respeito, a educação e a cordialidade para nossas comunicações na web.
O app de mensagens instantâneas mais popular no Brasil sofreu sanções e chegou a ser bloqueado três vezes entre 2015 e 2016.
Em dezembro de 2015, maio e julho de 2016, o WhatsApp teve o serviço suspenso após negar oferecer ou interceptar mensagens enviadas por alguns usuários, supostamente envolvidos em esquemas ilegais.
Para justificar os bloqueios, juízes de três estados citaram artigos do Marco Civil da Internet, especialmente os de número 10, 11 e 12.
Como resposta, partidos políticos questionam esses trechos do MCI, bem como seu uso para suspender o acesso ao aplicativo.
Segundo o Facebook, dono do WhatsApp, não é possível ter acesso às mensagens, ainda que requeridas pela Justiça, pois a criptografia empregada pela plataforma impede que sejam arquivadas no servidor da empresa.
O caso foi parar no Supremo Tribunal Federal, através do julgamento da ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 403 e da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5527.
Em junho de 2020, a ministra Rosa Weber, relatora da ADI 5527, afirmou que “seria um retrocesso tornar ilegal o uso da criptografia”, afirmando que o MCI não deve ser usado como suporte para interromper serviços de comunicação.
Neste ponto, você está por dentro dos conceitos, tipos, legislação e polêmicas envolvendo a responsabilidade de intermediários na internet.
Conhece mais algum caso ou quer tirar dúvidas? Então, escreva um comentário a seguir.
Se este conteúdo foi útil para você, compartilhe. Aproveite e acesse o blog da FIA para aprimorar os conhecimentos sobre direito e performance empresarial.
Um plano de continuidade de negócios (PCN) é uma estratégia essencial para minimizar impactos e…
Descubra o que é flexibilidade no trabalho e como essa tendência está transformando empresas, atraindo…
O futuro do trabalho em 2025 apresenta mudanças importantes para empresas e profissionais. Descubra as…
A ética na IA envolve princípios e práticas que orientam o uso responsável dessa tecnologia…
A auditoria externa é uma análise detalhada das finanças empresariais, garantindo precisão e conformidade com…
A matriz de materialidade é um método de grande utilidade para as empresas que têm…