Brasileiros de uma certa idade já ouviram tanto falar em Reforma Tributária que esse termo quase perdeu o significado.
Virou simplesmente algo que todo mundo reconhece como sendo fundamental para o país, mas que nunca é tirado do papel.
Por mais que a mentalidade seja essa, porém, é importante seguir acompanhando as novidades nesse tema.
Pois as circunstâncias políticas e econômicas do país estão em constante renovação e, nesse sentido, o cenário de amanhã pode ser mais favorável que o de hoje para que a reforma assuma caráter prático.
Sem contar que, atualmente, existe uma proposta de Reforma Tributária tramitando no Congresso Nacional.
Como envolve uma grande mudança em leis que regulamentam impostos, isso só pode ser executado com a aprovação de deputados e senadores.
Quer saber do que se trata essa reforma e qual é o impacto dela para o Brasil?
É isso que vamos abordar neste artigo. Aqui, você vai conferir:
Boa leitura!
Reforma Tributária é uma alteração significativa no sistema tributário, ou seja, no conjunto de impostos, taxas e contribuições que os cidadãos de um país pagam ao Estado.
Isso tudo está constituído na legislação, portanto, para que a reforma seja feita, é preciso que leis sejam alteradas.
No caso do Brasil, a Constituição Federal dispõe largamente sobre a atividade tributária no país.
Por isso, a Reforma Tributária que tramita no Congresso atualmente (falaremos mais sobre ela adiante) trata-se de uma Proposta de Emenda à Constituição, ou PEC.
Trata-se de uma lei que se difere das demais pelo fato de que altera partes da Constituição, a lei máxima do país.
Por isso, tem regras diferentes para apresentação, tramitação e aprovação do projeto.
É importante ressaltar que, para que se caracterize uma reforma, é necessário que boa parte das regras de tributação do país sejam alteradas – não apenas a exclusão ou substituição de determinado tributo.
Os esforços para modificar o sistema tributário brasileiro são sempre no sentido de simplificá-lo, já que é unânime, entre empresários e especialistas no assunto, que sua complexidade atrapalha.
Fora o gasto exigido das empresas com burocracia tributária, o que alcança incríveis R$ 60 bilhões por ano.
Portanto, não se trata de uma reforma que tem o objetivo principal de aliviar o bolso do contribuinte de forma direta, pois o dinheiro pago como tributo não vai necessariamente ser menor.
Indiretamente, porém, isso pode acontecer, conforme explicaremos melhor depois.
Assim como a Reforma Trabalhista, aprovada em julho de 2017, o propósito principal é desburocratizar a gestão das empresas e acabar com a guerra fiscal, como uma maneira de estimular a criação de empregos.
Procure alguém que seja contrário à ideia de se fazer uma Reforma Tributária e você provavelmente não vai encontrar.
Caso comece a perguntar como seria essa reforma, porém, a unanimidade se esvai e entram em cena as discordâncias.
É por isso que as tão aguardadas mudanças enfrentam tanta resistência para serem colocadas em prática.
Já foram apresentadas ao Congresso Nacional várias propostas, em governos diferentes, mas nunca houve um consenso ou a capacidade de se trabalhar em uma versão conjunta, que deixe executivo e Legislativo satisfeitos.
De acordo com o ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly, as mudanças nunca avançaram na questão da repartição da arrecadação entre União, estados e municípios.
Em seu último mandato como parlamentar, que não foi renovado nas últimas eleições, Hauly resgatou a PEC 293/04, apresentada há 15 anos.
Após assumir como relator do projeto, em novembro de 2018 ele concluiu parecer na Comissão Especial da Reforma Tributária na Câmara, convencido de que uma reforma simplificaria o atual sistema e reduziria o impacto sobre os mais pobres.
Quem apresentou a PEC 293/04, no entanto, foi o Poder Executivo.
E essa não foi a única proposta de Reforma Tributária lançada por um presidente e sua equipe.
Em 2008, foi apresentada a PEC 233, com o objetivo de simplificar o sistema tributário federal, unificando contribuições sociais e promovendo outras mudanças nas regras dos impostos.
Entre as tentativas de emplacar uma Reforma Tributária vindas do poder legislativo, destacam-se aquelas do economista Marcos Cintra, deputado federal por São Paulo entre 1999 e 2003.
Durante seu mandato, ele apresentou ao Congresso Nacional duas PECs com alterações no sistema tributário: a 183/1999 e 474/2001. Ambas acabaram arquivadas.
Cintra é um nome importante não apenas para reconstruir o histórico das tentativas de reforma, mas também para compreender o panorama atual, conforme explicaremos a seguir.
Depois de um ano de eleições, com um novo presidente e novos representantes no poder legislativo, é normal haver novidades em relação às reformas.
Por enquanto, é a Reforma da Previdência é a que recebe grande atenção dos noticiários, além de ser prioridade do governo e de deputados e senadores.
Mas também existe a intenção de levar adiante uma proposta de Reforma Tributária, e o nome de Marcos Cintra volta a aparecer, já que ele ocupa, atualmente, a posição de secretário especial da Receita Federal.
Cintra encabeçava a preparação do projeto, planejando a troca de até cinco impostos federais por apenas um.
No dia 3 de abril de 2019, porém, Baleia Rossi, deputado federal por São Paulo, apresentou à Câmara dos Deputados uma nova Proposta de Emenda Constitucional tratando de uma Reforma Tributária.
O texto da PEC é baseado em um projeto do economista Bernard Appy, que reúne tributos federais, estaduais e municipais, simplificando o sistema tributário.
Desde o início, Rodrigo Maia, presidente da Câmara, optou por apoiar a proposta apresentada por Rossi.
A reação do Poder Executivo, representado por Marcos Cintra, foi o de buscar a colaboração para trabalhar em uma solução conjunta com o legislativo.
No dia 22 de maio, a proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara e Cintra afirmou que o executivo opinaria sobre o texto no “momento oportuno”.
Segundo o deputado Baleia Rossi, as ideias do ex-deputado Luiz Carlos Hauly serão respeitadas nos debates sobre a nova proposta.
Depois de aprovada na CCJ, a PEC 45/2019 aguarda a criação de uma comissão especial, que será encarregada de analisar seu conteúdo.
Caso seja aprovada por essa comissão, a proposta vai para votação no plenário da Câmara dos Deputados.
A proposta que tramita na Câmara dos Deputados, apresentada por Baleia Rossi, tem o objetivo principal de simplificar os tributos que incidem sobre o consumo unificando algumas cobranças.
Desse modo, ficaria mais fácil estimar os impostos em cada operação do dia a dia, o que daria maior transparência ao sistema tributário.
Se a proposta for aprovada sem grandes alterações em seu texto, não deve significar um alívio no bolso dos consumidores e tampouco dos empresários.
Mas vale a pena explorar aqui outros aspectos que também poderiam aparecer em uma possível Reforma Tributária e ajudam a entender qual a importância de uma medida como essa.
O sistema tributário é uma das ferramentas que um país tem para combater a desigualdade. Isso pode ser feito, por exemplo, aliviando os impostos daqueles com baixa renda e taxando grandes fortunas.
A reforma também pode servir para reduzir a carga tributária no geral: sobre o consumo, sobre a contratação de funcionários, sobre a renda, etc.
Com a simplificação do sistema tributário, declarar e pagar os impostos fica muito mais fácil, o que reduz o tempo que uma empresa gasta com a atividade e com o planejamento tributário.
Mesmo que a tarefa tenha se informatizado e automatizado bastante nos últimos anos, essa simplificação ainda é bastante esperada.
Com um sistema tributário mais simples, menos empresas devem sonegar impostos – e ficará muito mais fácil monitorar as sonegações.
A reforma também deve incentivar que mais negócios saiam da informalidade e passem a contribuir com o Estado.
Lembramos que a proposta de Reforma Tributária da qual se fala hoje no Brasil apenas começou sua tramitação no Congresso.
Antes de ser aprovada, ainda terá que passar por várias etapas e poderá ter seu texto alterado.
Assim, ainda não é possível precisar qual será a real importância da PEC para o Brasil.
Nos tópicos a seguir, falaremos mais sobre as medidas propostas e os pontos que podem ser discutidos e modificados.
A PEC 45/2019 propõe extinguir três tributos federais, um estadual e um municipal: IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS, respectivamente.
No lugar deles, seria criado o IBS, ou Imposto sobre Operações com Bens e Serviços, que incide sobre o valor agregado, não sobre o consumo.
Algo parecido com o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), da proposta defendida por Luiz Carlos Hauly. O IVA, entretanto, unificaria nove tributos.
“Os efeitos esperados são extremamente relevantes, com uma simplificação do sistema tributário brasileiro e um aumento da produtividade e do PIB potencial do Brasil”, disse Baleia Rossi, autor da PEC 45/2019.
Segundo ele, a medida não reduziria a autonomia dos estados e municípios, que poderiam alterar a alíquota do novo imposto.
Ao mesmo tempo, a PEC eliminaria a “guerra fiscal fratricida” entre diferentes estados e diferentes municípios, segundo o deputado.
No entanto, a inclusão do ICMS, tributo estadual, e ISS, municipal, na PEC causa receios nos representantes do Poder Executivo.
O ministro da economia, Paulo Guedes, já manifestou publicamente a intenção de unificar primeiro os impostos federais.
Na mesma ocasião, porém, defendeu a ambição dos parlamentares ao incluir impostos dos estados e municípios na proposta, o que está além do alcance do Executivo, segundo ele.
O próprio Baleia Rossi já deixou claro, em entrevista à Exame, que sua proposta não é “anti-Guedes”.
“Pelo contrário, temos que fazer a quatro mãos: o Parlamento e o governo. Uma pauta dessa magnitude não anda se não houver diálogo e convergência com o governo”, afirmou.
A principal disposição da PEC 45/2019 é, conforme explicamos antes, unificar os seguintes impostos.
No lugar desses cinco impostos, a proposta é criar o Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS). A competência será compartilhada entre o União, estados e municípios.
A PEC propõe acrescentar o seguinte artigo (com parágrafos, incisos e outros artigos detalhando as regras do novo imposto) à Constituição:
“Art. 152-A. Lei complementar instituirá imposto sobre bens e serviços, que será uniforme em todo o território nacional, cabendo à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios exercer sua competência exclusivamente por meio da alteração de suas alíquotas.”
Para os entes federativos, é como se cada um tivesse seu próprio imposto. O contribuinte, no entanto, só verá um tributo.
Pela proposta, o cálculo das alíquotas será feito pelo Tribunal de Contas da União, com aprovação do Senado Federal.
Ela também estabelece que haverá uma lei complementar regulamentando o IBS, que será composto por três alíquotas, uma para cada ente federativo.
Estados e municípios poderão definir alíquotas diferentes do valor de referência por lei ordinária. Entretanto, a taxa será a mesma para todos os bens, serviços ou direitos.
O texto da PEC também propõe a criação de mecanismos de transferência de renda. Assim os impostos pagos por famílias mais pobres tenha um retorno maior para elas.
Esse mecanismo funcionaria através do cruzamento do CPF informado pelos consumidores no momento da compra com o cadastro único dos programas sociais.
Se aprovada a PEC, as novas regras não entram em vigor imediatamente.
O texto prevê duas regras de transição: uma sobre a substituição dos tributos (dez anos) e outra sobre a repartição das receitas entre os entes federativos (50 anos).
Segundo Bernard Appy, que concebeu o projeto da PEC 45/2019, a grande vantagem da proposta é que ela vai proporcionar um ganho de produtividade nas empresas brasileiras.
Isso estimularia a economia, compensando possíveis perdas.
Outra modificação importante é que o IBS será cobrado no destino (onde o produto ou serviço foi comprado, independentemente de onde foi produzido. Isso ajudará a acabar com a guerra fiscal entre estados.
De acordo com Appy, a política de incentivos fiscais não é a melhor maneira de estimular o desenvolvimento regional.
O ideal, defende o economista, é garantir arrecadação suficiente para que os entes federativos desenvolvam políticas públicas de fomento.
A desvantagem da PEC com os termos atuais é justamente o fato de incluir o ICMS e ISS, impostos estadual e municipal, fato que pode gerar muita resistência nas bases políticas regionais e atrapalhar o avanço do projeto.
Já se fala na formulação de uma lista de alterações na PEC, propostas por uma comissão interna do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
Essa proposta representaria os interesses dos governos estaduais, o que tornaria a PEC mais viável.
A grande preocupação dos estados é a possível perda de arrecadação e autonomia tributária.
Não há vínculo direto entre as reformas tributária e da previdência.
Enquanto a tributária mexe nos impostos cobrados das pessoas jurídicas, a da previdência modifica a legislação previdenciária do país.
Ou seja, as regras sobre a contribuição das empresas e trabalhadores para o INSS e prazos de aposentadoria. Questões que você pode entender melhor lendo este artigo.
A questão é que a Reforma da Previdência é prioridade absoluta no atual governo, para aliviar o orçamento da União.
Enquanto ela não sair, portanto, as chances da Reforma Tributária avançar no Congresso são poucas.
O sistema tributário de um país existe para que o Estado arrecade dinheiro para cumprir seu papel como provedor.
Pessoas físicas e jurídicas pagam impostos e recebem de volta saúde, educação, segurança, infraestrutura e outros serviços públicos.
Podemos – e devemos – questionar a qualidade desses serviços, mas é fato que eles são essenciais para o país. E o recolhimento de impostos é que os torna possíveis.
A Reforma Tributária objetiva tornar o emaranhado de tributos federais, estaduais e municipais mais simples.
O que aumenta a transparência da declaração e da cobrança, diminui a sonegação e combate a informalidade.
Em última instância, espera-se que isso tudo resulte em mais produtividade, renda e empregos no Brasil.
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