Você, provavelmente, já ouviu falar sobre o chamado Marco Civil da Internet. Mas sabe do que se trata?
Uma dica: tem a ver com a segurança (sua e de todas as pessoas).
Quando a internet se popularizou, acostumou-se ouvir que ela era um lugar sem fronteiras, barreiras e até leis.
Essa ideia, com certeza, caiu nos últimos anos.
Diferentes crimes e iniciativas foram gerando preocupações e legislações específicas.
A Lei 12.737/12, que ficou conhecida como Lei Carolina Dieckmann, tipificou delitos e crimes informáticos na esteira da repercussão do vazamento de arquivos pessoais que a atriz sofreu.
A Lei Geral de Proteção de Dados, que entrará em vigor em 2020, é outro caso que merece citação, assim como o GDPR europeu.
Junto a esses instrumentos, está o Marco Civil da Internet, mais um exemplo e um dos mais marcantes do direito digital, sem dúvidas.
Fruto de uma discussão de cinco anos, algumas polêmicas e mudanças que podem ser sentidas claramente, o Marco Civil fez aniversário de meia década recentemente – e já se discute sua validade.
Quer conhecer mais sobre a lei e a sua definição? Então, continue no texto ou navegue pelos tópicos a seguir:
Boa leitura!
O Marco Civil da Internet é uma lei (12.965/14) que regulamenta o uso e estabelece certos parâmetros em relação à internet e como ela é oferecida em território nacional.
Por esse objetivo ambicioso recebeu a alcunha “Constituição da Internet”.
Sua construção foi morosa, mas também abrangente.
É interessante apontar que a participação popular era possível via blogs oficiais e audiências realizadas no país inteiro.
Essa foi uma das razões para a demora em sair do papel: o processo começou em 2009 e a lei só foi ser sancionada em junho de 2014.
E quando se fala abrangência da ideia, esse entendimento fica claro já no 1º artigo:
Art. 1º Esta Lei estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil e determina as diretrizes para atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios em relação à matéria.
A incrível inovação que a internet trouxe veio acompanhada de uma enorme série de mudanças.
Mas isso trouxe também certos vácuos problemáticos. Um exemplo clássico é a pirataria. que se alastrou no setor audiovisual.
Independente do que você acha sobre a atuação de lojas de CDs, gravadoras e empresários nas décadas passadas, obviamente, não era justo que o trabalho de pessoas não fosse pago cada vez que um download dava acesso ao material criado.
Nessa questão em específico, as leis criadas até então não conseguiram impedir o problema, mas a atuação de empresas disruptivas, como Spotify e Netflix, ajudou a valorizar o criador de conteúdo.
Mas nem tudo pode ser resolvido com startups criativas e inovadoras.
É importante haver leis inteligentes, que levem em conta os interesses de todos os envolvidos e que sejam discutidas de forma aberta e ampla.
O desafio sempre é o mesmo quando envolve direitos do consumidor e a atuação de empresas: não ser tão burocrático e impeditivo que engesse o mercado, nem tão permissivo que deixe os consumidores em posição frágil.
Cinco anos depois de ter virado lei, o Marco Civil não foi o responsável por complicar o mercado de empresas de telecomunicações e ainda trouxe pontos positivos que abordaremos abaixo.
Mas é claro que, também, não foram só acertos.
Como esperado, a lei do Marco Civil teve defensores árduos e críticos vorazes.
Tim Berners-Lee, criador da World Wide Web (o famoso WWW), elogiou a “Constituição da Internet” antes mesmo de ela ser aprovada.
(…)finalmente um projeto de lei reflete como a internet deveria ser: uma rede aberta, neutra e descentralizada, em que os usuários são o motor para a colaboração e inovação
Já os críticos apontaram suas munições para algumas das obrigações que ela trazia, como a exigência de instalação de data centers em território nacional, seja por empresas multinacionais ou startups.
Esse ponto acabou sendo derrubado na versão final que virou lei.
O temor de que alguns de seus artigos possibilitariam a censura de conteúdos também foi apontado.
Mas um dos elementos mais polêmicos permanece.
A neutralidade da rede, como ficou conhecida, obriga empresas que oferecem internet a não discriminar sites, apps e plataformas com preços maiores ou separação por pacotes.
Por exemplo, não é permitido no Brasil que o pacote de internet seja limitado quando se aproximar do fim.
Também não é possível oferecer uma velocidade maior para quem usar o Netflix e limitar o Amazon Prime Video, por exemplo.
Curiosamente, recentemente vimos a neutralidade da rede sendo assunto novamente, mas nos Estados Unidos.
Uma decisão do FCC – Comissão Federal de Comunicações – acabou com a neutralidade, argumentando que empresas de telecomunicações não teriam incentivos para investir em infraestrutura.
A medida tomada pelo FCC foi considerada impopular e causou polêmica.
Como adiantamos no tópico anterior, esse foi um dos pontos que mais gerou discussão
O termo neutralidade significa a não tomada de uma posição.
Neste caso, ela se aplica a todo o conteúdo da internet.
Assim, as empresas de telecomunicação, que oferecem o serviço de acesso à grande rede, não podem discriminar esse conteúdo. Elas precisam se manter impassíveis.
Para usar um exemplo, uma provedora de internet não pode limitar a velocidade de um usuário que está acessando um determinado site, privilegiando assim um concorrente.
Isso impede que as companhias beneficiem empresas parceiras ou até elas próprias em detrimento de outros conteúdos.
A origem dessa ideia tem relação com o conceito original da internet, de ser um lugar onde o compartilhamento de informações era incentivado e o tráfego, livre.
Com a decisão nos Estados Unidos, muitas instituições e profissionais especializados posicionaram-se de forma contrária a qualquer mudança nesse sentido.
O argumento das telecoms é baseado em custos: oferecer pacotes especializados pode baixar os preços deles, enquanto manter a neutralidade é algo caro, já que todos os usuários têm plenos poderes para acessar o que quiserem na mesma velocidade.
Outro ponto muito importante sobre o qual o Marco Civil da Internet se debruçou é o da responsabilidade do conteúdo gerado por terceiros.
É disso que trata o artigo 19. Veja:
Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário
Isso é muito importante na era das redes sociais.
Empresas como Facebook, Twitter ou Google (mediante o YouTube) não serão responsabilizadas por um conteúdo postado em suas plataformas.
Entretanto, uma exceção é criada.
Caso sejam comunicadas judicialmente que um conteúdo é calunioso ou ofensivo, por exemplo, e as empresas mantiverem esse material no ar, elas poderão ser punidas.
Esse é um artigo importante, porque assegura a liberdade de expressão dos usuários de internet e retira a “culpa” das empresas por todo o conteúdo postado em suas plataformas.
Mas isso não quer dizer que a questão esteja completamente encerrada. Há uma ação que julga a constitucionalidade do artigo no STF (Superior Tribunal Federal).
A privacidade na rede foi outro dos pontos que o Marco Civil tocou de forma mais ampla.
Foram criadas regras claras, como os provedores de internet só poderem guardar registros de conexão dos usuários por no máximo um ano.
Empresas que operam na internet também têm um prazo limite para guardar esses dados, mas de seis meses.
Um ponto bastante importante foi a estipulação de que autoridades só poderiam ter acesso a esses dados mediante uma decisão judicial.
Isso gerou alguns maus bocados para os usuários de aplicativos como o WhatsApp. Em 2016, o aplicativo foi bloqueado pelo fato de não ter dado acesso à Justiça mesmo após a decisão ser tomada.
E esse foi apenas um de quatro casos envolvendo o WhatsApp, todos ocorridos entre 2015 e 2016.
Por enquanto, esse problema parece que não irá se repetir, mas a judicialização segue. Inclusive, com casos que antecedem até o Marco Civil da Internet.
Por exemplo, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) responsabilizou a Oi acerca do dever de manter dados cadastrais de seus clientes por um caso de 2009.
Ou seja, a discussão ainda vai longe.
As propostas para mudanças no Marco Civil da Internet não são uma novidade.
Em 2017, foi feita uma alteração pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), incluindo uma previsão que ajude a tirar do ar conteúdo que induza, instigue ou auxilie a autolesão, automutilação ou suicídio.
A ação veio na esteira do problema com o Jogo da Baleia Azul, que estimulava jovens a cometer atos violentos contra si mesmos.
Então, as mudanças são normais, já que falamos ainda de um ambiente em constante renovação, como é a internet.
Agora, alterações mais profundas, como o fim da neutralidade da rede, assim como aconteceu nos Estados Unidos, pode incentivar novas discussões e impactar os consumidores.
Como não poderia deixar de ser, o Marco Civil da Internet não pode tratar de todos os problemas que surgem na internet e causam divergências entre os diversos atores nela.
Mas foi um bom primeiro passo para começar a olhar para esse campo.
A Lei Geral de Proteção de Dados – Lei Nº 13.709/2018 – pega a ideia de privacidade na rede do Marco Civil e expande.
Entre as regras mais comentadas que a LGPD criou está a necessidade da empresa ter total consentimento do usuário para armazenar e usar seus dados. Nada de letras pequenas ou coisas subentendidas.
A questão da proteção dos dados e a importância que eles têm motivou essa atitude, também por influência do GDPR europeu e casos de vazamentos de informações que foram até usadas em campanhas políticas.
Portanto, o que podemos esperar no Direito Digital e em novas leis que tenham a internet como foco é a reação a casos importantes no mundo que inspirem a necessidade de criar leis e precauções.
Outro exemplo que pode ser usado é a disseminação de fake news.
O relator do Marco Civil da Internet, o deputado federal Alessandro Molon, mostrou preocupação com o funcionamento das redes que espalham notícias falsas e lamentou que o Marco Civil não conseguiu impedir isso.
Essa preocupação evoluiu para a chamada Lei das Fake News, que causou polêmica, com derrubada de veto presidencial e bate-boca entre parlamentares.
A popularização da internet no Brasil tem menos de duas décadas de vida. E desde lá a internet já mudou inúmeras vezes. Para o bem e para o mal.
Golpes financeiros, ataques à honra, vazamento de dados sensíveis, disseminação de informação falsa, tudo isso acontece na grande rede mundial de computadores.
Por isso, é importante que a fiscalização e punição de culpados esteja presente não só para crimes nas ruas, mas também no mundo virtual.
O Marco Civil da Internet foi realmente um marco, obtido depois de inúmeras discussões.
Mas, hoje, cinco anos depois, ainda há dúvidas, contradições e a necessidade de atualizações.
E isso não é porque o trabalho foi mal realizado ou a ideia é falha. Afinal, até a Constituição Brasileira ganha emendas. Mas, sim, porque falamos de um ambiente que passa por constante atualização.
Portanto, o legado, mais do que as regras específicas que trouxe, é ter criado uma discussão sobre direitos e deveres.
E você, o que acha do Marco Civil da Internet e o que ele trouxe para o debate?
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